O Código Brasileiro de Governança Corporativa e a ICVM nº 586/2017

Por Gabriela de Sá

A governança corporativa corresponde a um conjunto de princípios e regras que visam o desenvolvimento das relações internas e externas da empresa (entre sócios, administradores, auditores e outras parte interessadas), bem como a preservação e perpetuação da empresa, afastando interesses pessoais que possam prejudicar o andamento dos negócios.

Embora as boas práticas de governança corporativa não constituam, de forma geral, exigência legal para as empresas, tais recomendações passaram a ter cada vez mais destaque em razão da segurança conferida aos investidores. Diante desse cenário, os princípios da governança corporativa adquiriram força de lei, de forma que empresas que desejassem negociar suas ações em segmentos especiais da bolsa (Novo Mercado, Nível 1 ou Nível 2 de Governança Corporativa) viram-se obrigadas a observar tais práticas.

Então, com a publicação da Instrução CVM nº 586, em 08 de junho de 2017, as boas práticas de governança corporativa passaram a ser exigidas de todas as companhias que negociam suas ações em bolsa de valores (seja no mercado regular, seja nos segmentos especiais).

Por meio da ICVM nº 586, foi incluída, na ICVM nº 480 (que dispõe as regras para as companhias emissoras de valores mobiliários negociados em mercados regulamentados), o modelo “pratique ou explique”, segundo o qual a companhia deverá indicar quais práticas de governança corporativa adota e, caso não as pratique, explicar o motivo. As companhias sujeitas à ICVM nº 480 deverão entregar à Comissão de Valores Mobiliários – CVM, em até sete meses contados do encerramento do exercício social, Informe sobre o Código Brasileiro de Governança Corporativa (Companhias Abertas).

Nesse Informe, serão indicadas quais práticas, previstas no Código, a companhia aplica, bem como todas as explicações para aquelas que não são implementadas. O Código, elaborado sob a coordenação do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa – IBGC e com a contribuição de onze das mais importantes entidades do mercado de capitais, contém uma série de práticas recomendadas, tais como: (i) a ausência de vinculação dos votos dos administradores aos acordos de acionistas; (ii) a não cumulação de cargos do presidente do conselho de administração e do diretor presidente; (iii) a implementação de processo anual de avaliação do conselho de administração; (iv) a existência de uma área de auditoria interna vinculada diretamente ao conselho de administração.

A edição da ICVM nº 586 representa um importante avanço para o modelo brasileiro de governança corporativa, ao introduzir o Código Brasileiro de Governança Corporativa como parâmetro para todas as companhias de capital aberto, as quais não poderão simplesmente rejeitar a aplicação das práticas recomendadas, devendo justificar a recusa. De tal forma, até mesmo as empresas de capital fechado serão incentivadas a adequar suas práticas, com vistas ao seu futuro crescimento, exigências do mercado para fins de investimento e estruturação de dívida, e, por fim, potencial abertura de capital.

A emissão de debêntures como alternativa para a capitalização das empresas

Por Gabriela de Sá

 

Em tempos de crise, os meios de capitalização de empresas ganham ainda mais destaque. A obtenção de crédito junto às instituições financeiras torna-se uma opção ainda mais complicada, especialmente pela maior restrição e custos proibitivos da negociação.

Nesse cenário, a emissão de debêntures pode se apresentar como uma alternativa. As debêntures são títulos de crédito emitidos por uma companhia, com vistas a obter investimento de terceiros. Na prática, as debêntures funcionam como um empréstimo, mas, ao invés de uma instituição financeira emprestando o dinheiro, esse papel é exercido por investidores, que adquirem esses títulos e tornam-se credores (os debenturistas) da companhia emissora.

Por serem títulos de renda fixa, as debêntures, para o investidor, combinam o atrativo da previsibilidade dos rendimentos com possibilidades maiores de ganho. Há, porém, um risco um pouco mais elevado do que nos demais títulos de renda fixa, pois não são garantidas pelo Fundo Garantidor de Créditos, podendo ou não ter garantias adicionais.

Quanto às garantias, existem quatro tipos de debêntures: (1) com garantia real, na qual bens específicos da emissora servirão de garantia, com a instituição de hipoteca, penhor ou anticrese; (2) com garantia flutuante, na qual os debenturistas têm privilégio sobre o ativo da emissora, mas não há vinculação a um bem específico, podendo a emissora dispor livremente dos seus bens; (3) quirografária, sem qualquer garantia; e (4) subordinada, na qual, em caso de falência, o crédito dos debenturistas prevalece  apenas sobre o crédito dos sócios da emissora.

A emissão de debêntures pode ser (i) privada, (ii) pública com esforços restritos ou (iii) pública. Na oferta privada, a empresa emite as debêntures apenas para alguns credores pré-determinados, que, na prática, já aceitaram previamente a compra desses títulos. Na oferta pública com esforços restritos, a emissão poderá ser feita por sociedades anônimas de capital aberto ou fechado, mas serão destinadas apenas a um número limitado de investidores profissionais, conforme a Comissão de Valores Mobiliários. Na oferta pública, as debêntures são destinadas ao público em geral, inclusive para investidores não profissionais, mas apenas poderão ser emitidas por companhias de capital aberto.

Por fim, cabe destacar que, embora as debêntures estejam mais ligadas às sociedades anônimas, existem discussões quanto à possibilidade de sua emissão por sociedades limitadas. Embora as Juntas Comerciais ainda se mostrem resistentes a essa possibilidade, a crescente aplicação dos institutos das sociedades anônimas às limitadas (tais como as quotas preferenciais e o conselho de administração) representam um importante avanço no sentido de admitir debêntures de sociedades limitadas.

Portanto, as debêntures podem representar uma importante estratégia para as empresas que buscam um meio de capitalização de suas atividades, sem, contudo, sofrer com as restrições características das negociações bancárias.