Os contratos de franquia e master-franquia

Direito Empresarial                

Por Gabriela de Sá

As franquia são regidas, no Brasil, pela Lei nº 8.955/94, que em seu artigo 2º, conceitua esse sistema como sendo aquele no qual “um franqueador cede ao franqueado o direito de uso de marca ou patente, associado ao direito de distribuição exclusiva ou semi-exclusiva de produtos ou serviços e, eventualmente, também ao direito de uso de tecnologia de implantação e administração de negócio ou sistema operacional desenvolvidos ou detidos pelo franqueador, mediante remuneração direta ou indireta, sem que, no entanto, fique caracterizado vínculo empregatício”.

A estrutura tradicional desse sistema corresponde à situação na qual a empresa constitui uma rede de franquias com vistas a expandir sua marca. Neste quadro, existem duas figuras envolvidas: (i) a do franqueador, que detém os direitos sobre a marca e as tecnologias; e, (ii) o franqueado, em favor do qual serão cedidos esses direitos.

No entanto, merece destaque a sistemática da master-franquia (“master franchising”), na qual verifica-se a presença de três figuras: (i) o proprietário da marca e das tecnologias; (ii) o administrador da franquia; e (iii) o franqueado. Nos contratos de master-franquia, o proprietário realiza cessão em favor de terceiro (master-franqueado ou sub-franqueador), para que este possa agir como se franqueador fosse, firmando contrato de franquia com sub-franqueados e administrando a rede de estabelecimentos em determinada região. Atualmente, no Brasil, existem empresas especializadas em gerenciar várias redes de franquia, constituindo as chamadas “holdings de franquias”.

Essa é uma solução interessante para aquela empresa que deseja constituir uma rede de franquias, mas sem precisar, necessariamente, administrar essa rede, podendo optar pela contratação de uma holding de franquias.

Texto publicado na News nº 23/2016, em 21.12.2016

Decisão de 1ª instância declara a inconstitucionalidade da cobrança de Taxa de Marinha

Direito Imobiliário                 

Por Pedro Amorim

Um grande desconforto aos proprietários de terrenos situados em áreas próximas de rios e de mar diz respeito à cobrança de taxas de foro ou ocupação, devidas à União pelo uso, posse ou transação dos denominados terrenos de Marinha.

Apesar do instituto arcaico está amparado em delimitação de áreas por meio de linha traçada em 1831, existem poucas decisões que combatem essa cobrança, sendo a jurisprudência, geralmente, favorável à cobrança.

Afasta-se da regra, entretanto, a decisão proferida pelo Juiz Federal Marco Bruno Miranda Clementino, titular da 6ª Vara Federal do Rio Grande do Norte, a qual declarou a inconstitucionalidade da taxa cobrada pela União relativa ao uso ou posse dos terrenos de Marinha. Como justificativa, levanta a violação ao princípio da segurança jurídica, tendo em vista ser inconcebível um limite legal estipulado por linha imaginária, traçada em 1831 e que é fisicamente bastante mutável. Além disso, entende que a cobrança afeta diretamente a região Nordeste, cuja grande parte da economia é mantida pela exploração turística das faixas de praia.

Apesar de não ter ocorrido o trânsito em julgado da sentença, que, certamente, será objeto de discussão em instância superior, há que se considerar o fato de que ela, inegavelmente, abre um grande precedente para futuros processos de mesma natureza, principalmente ao se tratar da região Nordeste.

Texto publicado na News nº 22/2016, em 07.12.2016

Licitações – Participação de empresas do mesmo grupo econômico e/ou empresas com sócios em comum no mesmo certame

Direito Administrativo 

Por Gabriel Oliveira

Tema que tem despertado bastante polêmica atualmente é a participação de empresas com sócios em comum em licitações. Tal assunto foi analisado pelo Tribunal de Contas da União nos autos da Representação nº 035.784/2015-6, em sessão do Plenário do dia 01/11/2016.

O voto do Ministro André de Carvalho consolidou o acórdão nº 2803/2016, que pacificou a matéria no sentido de não existir vedação legal à participação, no mesmo certame licitatório, de empresas do mesmo grupo econômico ou com sócios em relação de parentesco. No entendimento do Ministro, “embora tal situação possa acarretar quebra de isonomia ente as licitantes, a demonstração de fraude à licitação exige a evidenciação do nexo causal entre a conduta das empresas com sócios em comum ou em relação de parentesco e a frustração dos princípios e dos objetivos da licitação.

Assim, abre-se o precedente de que a participação de empresas em um mesmo processo de contratação pública, pertencentes a sócios comuns, pode ser considerada regular, se atuarem de forma independente, sem negociatas que possam macular a competitividade e a isonomia do certame.

Entretanto, importa destacar que eventual irregularidade se mostra patente quando essa relação acarretar a exclusão de potenciais licitantes, a exemplo do que ocorre na modalidade convite, em que participantes são convidados pela Administração e a publicidade da licitação é mais restrita. Neste caso, a participação de empresas do mesmo grupo econômico ou com sócios comuns, evidentemente, é vedada.

 

Texto publicado na News nº 22/2016, em 07.12.2016

Da cobrança da tarifa de água por consumo e por estimativa

Direito Civil                 

Por Rafael Collachio de Almeida

Recentemente deu-se início a uma discussão jurídica sobre a legalidade da forma como as concessionárias dos serviços de água e esgoto vêm cobrando pelos serviços prestados. Isto porque a legislação aplicável, na maior parte dos estados, prevê a possibilidade de cobrança pelo consumo efetivo ou por uma estimativa de consumo.

O cerne da discussão reside na subjetividade do critério de cobrança por estimativa. Em linhas gerais, a cobrança por consumo efetivo pressupõe uma franquia mínima de consumo e um valor adicional por determinada quantidade adicional consumida.  A cobrança por estimativa, por outro lado, pressupõe uma quantidade estimada de consumo, que geralmente leva a cobranças consideravelmente maiores, em razão dos coeficientes financeiros aplicados, normalmente um multiplicador da tarifa mínima.

Como exemplo, em Pernambuco temos, para o consumo efetivo, o valor de R$ 54,80 pelo consumo dos primeiros 10 metros cúbicos de água, acrescido do valor de R$ 10,86 pelo consumo de cada metro cúbico adicional; ao passo que a cobrança pelo consumo estimado pressupõe a tarifa de R$ 54,80 por metro cúbico de água. Isso significa que, excetuada a tarifa mínima, a cobrança por estimativa é cinco vezes maior.

Ocorre que os tribunais têm consolidado o entendimento de que a cobrança por estimativa somente é legal quando não é possível a aferição do consumo efetivo por qualquer motivo: ausência de hidrômetro, dificuldade de acesso à unidade etc. Do contrário, não se justifica tal critério de cobrança.

Recentemente, inclusive, em razão dessa discussão, o Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão determinou à concessionária local a suspensão dessa forma de cobrança. É recomendável, portanto, que os consumidores se atentem à forma como vêm sendo cobrados, para que evitem cobranças dessa natureza.

Texto publicano na News nº 21/2016, em 23.11.2016

Suspensão do plano de saúde dos funcionários afastados

Direito Trabalhista 

Por Felipe Medeiros e Mariana Matoso

Durante o período de afastamento de colaboradores por auxílio doença ou aposentadoria por invalidez, é bastante comum que as empresas tenham dúvida se elas podem solicitar aos funcionários afastados o pagamento de sua contribuição ou cota parte do plano de saúde.

Não há na legislação nada que impeça a empresa de convocar o funcionário afastado para efetuar o pagamento do plano de saúde, mas existe a possibilidade dessa convocação ser entendida como um dano moral, já que seria uma cobrança a ser feita justamente quando os funcionários estão precisando utilizar os serviços médicos.

Considerando que o contrato de trabalho resta suspenso durante o período em que perdurar a concessão do benefício, cabe à empresa antecipar o pagamento do plano de saúde para posterior quitação pelo empregado, quando este retornar as atividades, sempre observando a autorização de desconto e o limite de 30% do salário liquido com relação ao desconto a ser realizado.

Ressalte-se que os valores adiantados para pagamento do plano de saúde podem ser cobrados pelo empregador pelos meios legais ou, ainda, ser estabelecida uma forma de descontos assumidos pela empresa após o retorno do trabalhador, atentando-se para a prévia autorização expressa do trabalhador e da limitação de 30% já referida.

O desconto acima do percentual de 30% é arbitrário, sendo a parcela que exceder passível de restituição pela empregadora, que ainda pode ser condenada ao pagamento a título de indenização de dano moral. É neste sentido a jurisprudência pátria, já que a empresa não pode cancelar o plano de saúde de funcionário afastado, que se traduz em obrigação acessória da empresa ainda que o contrato esteja suspenso, ou seja, independe da prestação de serviço do trabalhador.

Texto publicado na News nº 21/16, em 23.11.2016

Antecipação tributária do ICMS na aquisição de mercadoria de outros Estados

Direito Tributário                 

Por Rafaela Martins

O Estado de Pernambuco editou a Portaria SF nº 068/2016, alterando a redação original da Portaria nº 147/2008, relativamente à aquisição de mercadoria procedente de outra Unidade da Federação por contribuinte optante do Simples Nacional.

A antecipação tributária do ICMS para determinados contribuintes que adquirem mercadoria em outra Unidade da Federação, inclusive para uso, consumo e ativo fixo, é prevista na Portaria nº 147/2008 e não se aplica ao contribuinte optante do Simples Nacional, na modalidade de Microempreendedor Individual – MEI. Ocorre que, anteriormente, essa não antecipação do ICMS era incondicional, o que foi alterado pela nova Portaria SF nº 068/2016.

De acordo com a referida norma, não haverá recolhimento antecipado para o contribuinte optante do Simples Nacional, na modalidade de MEI, tão somente se a soma das aquisições não ultrapassar o limite de receita bruta anual previsto para enquadramento na condição de MEI, conforme previsto no § 1º do art. 18-A da Lei Complementar Federal Nº 123, de 14.12.2006. Para efeito de verificação, serão computadas as aquisições efetuadas em cada exercício, a partir do dia 1º de janeiro de cada ano.

Caso não cumprida a nova condição, o imposto antecipado será devido a partir do dia subsequente em que excedido tal limite. Dessa forma, o contribuinte somente voltará a ser considerado regular, para efeito de dispensa da antecipação do ICMS, a partir do 1º dia do exercício subsequente àquele em que o limite de aquisições supramencionado seja observado.

Texto publicado na News nº 20/2016, em 09.11.2016

A execução de devedores solidários de empresas em recuperação judicial

Direito Societário 

Por Gabriela de Sá e Tatiana Rands

Em 19 de setembro deste ano, foi publicada, no Diário de Justiça Eletrônico, a Súmula nº 581 do Superior Tribunal de Justiça, que dispõe: “A recuperação judicial do devedor principal não impede o prosseguimento das ações e execuções ajuizadas contra terceiros devedores solidários ou coobrigados em geral, por garantia cambial, real ou fidejussória”.

Essa súmula representa um importante marco na solução de controvérsias sobre a interpretação do caput do art. 6º e do §1º do art. 49, dispositivos da Lei de Recuperação e Falência (LRF – Lei nº 11.101/2005).

A primeira corrente defendia que, por força do art. 6º da LRF (“Art. 6o A decretação da falência ou o deferimento do processamento da recuperação judicial suspende o curso da prescrição e de todas as ações e execuções em face do devedor, inclusive aquelas dos credores particulares do sócio solidário”), seriam suspensas não apenas as ações e execuções em face do devedor principal, ou seja, a empresa que requereu a recuperação judicial, mas também de seus devedores solidários, tais como os sócios avalistas, em razão da menção ao “sócio solidário”.

Já a segunda corrente sustentava que a suspensão não poderia ser estendida para os devedores solidários, sendo benefício aplicável apenas para a empresa em crise, com base no que determina o §1º, do art. 49 da LRF (“Art. 49. Estão sujeitos à recuperação judicial todos os créditos existentes na data do pedido, ainda que não vencidos. § 1º Os credores do devedor em recuperação judicial conservam seus direitos e privilégios contra os coobrigados, fiadores e obrigados de regresso”). Adotando a segunda corrente, o STJ pacificou a questão, estando, também, em conformidade com o entendimento que já vinha sendo seguido pela maioria dos tribunais brasileiros.

Texto publicado na News nº 20/2016, em 09.11.2016

STJ decide pela possibilidade de atribuir ao adquirente a responsabilidade pelo pagamento de comissão de corretagem

Direito Imobiliário                 

Por Brenda Oliveira e Thiago Jacobovitz

Com o mercado imobiliário aquecido e os juros atrativos, até pouco tempo atrás, as construtoras vinham investindo pesado em marketing. Os eventos de lançamentos eram verdadeiras festas e os stands de venda, um espaço de conforto e repleto de profissionais dispostos a auxiliar e sanear todas as dúvidas. Entre estes, indispensável a presença dos Corretores de Imóveis, cuja responsabilidade pelo pagamento de sua comissão deu ensejo a diversas discussões no Poder Judiciário.

A prática do mercado é de que quem procurou os serviços do corretor paga a comissão. Assim, muitos adquirentes ingressaram na Justiça com pedido de devolução de valores pagos, alegando que não tiveram opção de escolha do Corretor; que este lhe foi oferecido no stand de vendas da construtora e que, portanto, o custeio deve ser feito pela construtora, contratante e beneficiária final de serviços.

No entanto, a 2ª Seção do Supremo Tribunal de Justiça decidiu, de forma unânime, pela validade da cláusula que transfere ao consumidor o pagamento da comissão. O entendimento foi de que as incorporadoras têm efetivamente transferido esse custo ao consumidor, por meio da terceirização do serviço e que, se assim não o fosse, seria ajustado este custo como parte integrante do preço.

São necessárias clareza e transparência na previsão contratual, sendo fundamental a prévia informação do consumidor quanto ao custo e especificação do valor ajustado para a compra e venda e para a comissão de corretagem. Sem o cumprimento destas condicionantes, o adquirente que se sentir prejudicado poderá ingressar com ação judicial que vise à restituição dos valores pagos.

Texto publicado na News nº 19/2016, em 20.10.2016

Nova proposta de modificação na Lei Geral de Licitações e Contratos Administrativos

Direito Administrativo 

Por Débora Costa

Neste último mês, Senado e Governo propuseram alterações ao texto da Lei de Licitações nº 8.666/93, pontualmente no que concerne à contratação de projetos e obras de engenharia. Segundo o relator do projeto, o Senador Fernando Bezerra Coelho (PSB-PE), o objetivo é unificar regras criadas ao longo dos 23 anos da lei, modernizar seu texto e dirimir conflitos de grupos de interesse no setor de construção civil.

Dentre as modificações, a Contratação Integrada (regime de execução contratual em que a contratada é responsável tanto pela elaboração do projeto básico, quanto do executivo, bem como pela execução e entrega da obra finalizada) será permitida para obras orçadas em valores acima de R$ 100 milhões de reais.  Atualmente este tipo de contratação é usualmente utilizada e permitida no Regime Diferenciado de Contratações Públicas em casos específicos.

Outra inovação trazida/proposta é o aumento do valor da garantia de execução, saindo do teto atual de 20%, podendo variar entre 30% e 100% do valor do projeto. Na mesma linha, com o intuito de garantir a conclusão da obra, a chamada Matriz de Risco será determinada pela lei para definir quais as responsabilidades e riscos assumidos pelas partes, tornando clara e objetiva a cobrança de quem deixou de cumprir suas obrigações.

As alterações na literatura legal cuidam ainda de acabar com a indefinição sobre nível de projeto, determinando exigências objetivas para o item.

Texto publicado na News nº19/2016, em 20.10.2016

O uso das novas tecnologias na prática jurídica

Direito Civil                 

Por Sérgio Araújo e Rafael Collachio

Incontestável é o impacto positivo que a tecnologia vem imprimindo dentro do mundo jurídico, seja porque trouxe um novo arcabouço de ferramentas aptas a dar maior celeridade ao processo, seja porque trouxe maiores reflexões sobre matérias que hoje compõem precedentes do que se convencionou chamar de Direito Digital.

Com tais avanços, o Judiciário vê-se obrigado a repensar determinados procedimentos em que se considerava imprescindível a proximidade física para realização do ato de intimação. Se no Direito Internacional já tínhamos precedentes de intimações por meio eletrônico ou rede social, como Twitter e Facebook, no Brasil tais possibilidades são cada vez mais reais.

Recentemente tivemos, no Brasil, exemplos de situações em que se utilizou do aplicativo WhatsApp com o intuito de facilitar a comunicação entre as partes e o juízo. Em um desses exemplos, em 2014 um juiz de Presidente Médici/RO determinou que a autora de um processo fosse encontrada e notificada por meio do aplicativo em questão.

De forma semelhante, o aplicativo também tem sido utilizado com a finalidade de informar a respeito de processos que tramitam em determinada vara ou seção. A exemplo disso, a 7ª Vara Criminal Federal em São Paulo oficializou essa prática e, desde então, faz o cadastro dos interessados, que passam a poder agendar audiências com os magistrados e diligências para consultas aos autos, bem como retirar certidões e alvarás, entre outros.

Mesmo a nossa legislação processual ainda não estando devidamente atualizada para abraçar o mundo da tecnologia, é natural que o ordenamento jurídico seja adaptado, aos poucos, para essa nova realidade, fazendo um constante diálogo entre a tecnologia e o Direito, a fim de solucionar casos concretos e trazer mais celeridade e eficiência ao nosso processo judicial. ­

Texto publicado na News 18/2016, em 05.10.2016