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A dissolução parcial de sociedade e o impacto no patrimônio do sócio

Dentre as várias possibilidades jurídicas para o encerramento de uma sociedade empresarial, em relação a um dos sócios, encontra-se a ação de dissolução parcial de sociedade.

Na dicção do Código de Processo Civil, a ação de dissolução parcial de sociedade visa resolver a sociedade em relação ao sócio falecido, excluído ou que exerceu o direito de retirada ou recesso; a apuração dos haveres do sócio falecido, excluído ou que exerceu o direito de retirada ou recesso; ou, somente a resolução ou a apuração de haveres.

Como consequência natural da dissolução parcial de sociedade, deve-se verificar qual é o valor da quota e/ou ação do sócio falecido e/ou excluído e/ou retirante, sendo um importante desafio verificar-se e regular-se adequadamente a apuração dos haveres devidos.

Mas, quais os impactos que uma ação de dissolução parcial de sociedade tem em relação ao patrimônio dos demais sócios?

É de conhecimento de todos os operadores do Direito que os sócios respondem por seus atos societários, perante terceiros, desde o primeiro momento em que se inicia a operação negocial.

O Código Civil, por sua vez, regula, nos artigos 1.001 a 1.009, a responsabilidade dos sócios em relação aos direitos e obrigações entre si e terceiros, que devem ser observadas e cumpridas durante todo tempo em que a relação jurídica foi firmada, levando-se em conta, principalmente, o percentual de sua participação no capital social.

Isso significa que, em caso de eventual descumprimento da sociedade para com um sócio, a responsabilidade deste ficará limitada à sua quota social. E, seu patrimônio pessoal, via de regra, não será atingido, diante da regra da autonomia patrimonial da sociedade, prevista no artigo 49-A, do Código Civil, segundo a qual “a pessoa jurídica não se confunde com os seus sócios, associados, instituidores ou administradores”.

Até então, tinha-se um cenário de certa tranquilidade patrimonial para os sócios de uma sociedade empresarial, inclusive em sede de ação de dissolução parcial de sociedade, ante a regra dos artigos 604, § 1º, e, 609, ambos do Código de Processo Civil cumulado com o artigo 1.031, §2º, do Código Civil.

Inobstante, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, em recente decisão, no recurso n° 2040083-24.2023.8.26.0000, envolvendo o tema da ação de dissolução parcial de sociedade, permitiu que o patrimônio pessoal do sócio remanescente fosse bloqueado, inclusive, sem a necessidade de apresentação do incidente de desconsideração da personalidade jurídica.  

Segundo o Relator, “tem-se discutido qual a interpretação mais adequada e correta para o artigo 601, do Código de Processo Civil, identificando responsabilidade efetiva dos sócios remanescentes, que usufruem do capital fornecido pelo sócio retirante ou excluído enquanto não pagos seus haveres, sendo certo que não podem, simplesmente, impor a transferência dos riscos empresariais para quem teve rompido o vínculo societário”.

Entenderam os julgadores da Corte Paulista que “não é admissível que os sócios remanescentes, pura e simplesmente, capturem o capital do antigo sócio, usufruam do patrimônio alheio (muitas vezes, como no caso concreto, durante anos) e, ao final, imponham um inadimplemento irreversível, inviabilizando, em virtude dos resultados negativos da atividade empresarial realizada após o rompimento do vínculo societário, o pagamento dos haveres devidos pela pessoa jurídica, ficando isentos de qualquer responsabilidade patrimonial”.

Segundo eles, “os artigos 601 e 604, §1º, do Código de Processo Civil precisam ser interpretados de maneira conjugada e em consonância com a dinâmica funcional da atividade empresarial exercida por uma sociedade, como ente imaterial, não sendo viável, nas circunstâncias concretas aqui expostas, deixar de reconhecer a responsabilidade patrimonial dos agravantes. Não é, nem mesmo, necessária a desconsideração da personalidade jurídica e a perquirição das hipóteses concretas previstas no artigo 50, do Código Civil, pois, conforme as regras processuais regentes do procedimento especial da ação de dissolução parcial de sociedades, os sócios remanescentes são, desde o início do trâmite do processo, incluídos na relação processual. Há de se destacar, inclusive, que esta inclusão obrigatória perderia sua razão de ser caso não pudessem ser extraídos os reflexos patrimoniais em relevo, os quais, como o acima exposto, derivam de uma interpretação sistemática da legislação vigente”.

Assim, percebe-se que, doravante, apesar de todo regramento quanto à responsabilização do sócio numa sociedade, o seu patrimônio poderá sofrer, de forma mais simplificada, os impactos decorrentes de uma ação de dissolução parcial de sociedade, sem que haja a prévia instauração do incidente da desconsideração da personalidade jurídica, tudo isso para se evitar uma “fuga” da responsabilidade do sócio remanescente quanto às suas obrigações societárias.

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