Por: Grazyelly Oliveira – Imobiliário
A 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) analisou um importante caso que envolve a aplicação da Súmula 308 nos contratos de alienação fiduciária. O julgamento ocorreu em um agravo interno, onde o ministro relator, Antônio Carlos Ferreira, destacou a relevância jurídica da questão e determinou o prosseguimento da discussão por meio de recurso especial.
A controvérsia central é se a proteção prevista na Súmula 308, que impede a eficácia da hipoteca contra adquirentes de imóveis quando firmada entre a construtora e o agente financeiro, antes ou depois da promessa de compra e venda, pode ser estendida, por analogia, aos casos de alienação fiduciária.
Resumidamente, no caso concreto, uma construtora transferiu a propriedade resolúvel de um apartamento e uma vaga de garagem a uma administradora de consórcios, por meio de alienação fiduciária. Três anos depois, mesmo com a propriedade já consolidada em nome da credora fiduciária em decorrência do inadimplemento, a construtora firmou um contrato de promessa de compra e venda com uma terceira parte, que, posteriormente, cedeu os seus direitos a outras pessoas. Estas, ao descobrirem que a propriedade do imóvel já havia sido consolidada em favor da credora fiduciária, ajuizaram ação para anular esse ato.
O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul deu provimento à ação e desconstituiu a propriedade fiduciária, aplicando, por analogia, a Súmula 308. No entanto, essa decisão foi contestada sob o argumento de que hipoteca e alienação fiduciária possuem naturezas jurídicas distintas.
Ao analisar o caso, o ministro relator destacou que, enquanto na hipoteca o devedor continua proprietário do bem, na alienação fiduciária a propriedade resolúvel é transferida ao credor fiduciário, cabendo ao devedor apenas a posse direta. Assim, quando o devedor fiduciante negocia o imóvel, ele já não possui legitimidade para dispor da propriedade, o que caracteriza uma “venda a non domino“, ou seja, sem eficácia jurídica perante o verdadeiro titular do bem, mesmo que o adquirente atue de boa-fé.
Além disso, o relator advertiu que aplicar a Súmula 308 aos casos de alienação fiduciária poderia comprometer a segurança jurídica e o equilíbrio econômico dessas operações, elevando os riscos para os credores e tornando o financiamento imobiliário mais oneroso. Ferreira ressaltou, ainda, que a estabilidade nos contratos de alienação fiduciária é essencial para garantir o desenvolvimento econômico e o acesso ao crédito responsável ao crédito. Com a conversão do agravo em recurso especial, caberá agora à 4ª Turma do STJ decidir de forma definitiva sobre o tema. Ainda assim, o posicionamento já sinalizado pela Corte é claro: a proteção prevista na Súmula 308 não se estende à alienação fiduciária.