A arbitragem constitui meio de resolução alternativa de conflitos, de modo que é possibilitado às partes valer-se dela para dirimir litígios relativos a direitos patrimoniais disponíveis de forma técnica e célere.
Justamente pelo fato de ser um método alternativo de solução de conflitos, independente das regras e normas que regem o Poder Judiciário, as sentenças proferidas nos procedimentos arbitrais não estão sujeitas à homologação pelo Poder Judiciário e, além disso, são irrecorríveis, uma vez que a jurisdição arbitral é única e, portanto, não sujeita ao duplo grau de jurisdição.
A irrecorribilidade das sentenças arbitrais encontra-se expressamente prevista no art. 18 da Lei nº 9.307/1996. Além disso, a referida Lei também prevê em seu art. 31 que a sentença arbitral produz os mesmos efeitos da sentença proferida pelos órgãos do Poder Judiciário, constituindo, assim, título executivo.
Em que pese não haver a possibilidade de apresentação de recurso em face da sentença arbitral, a própria Lei de Arbitragem permite que as partes possam pleitear, junto ao Poder Judiciário, a declaração de sua nulidade, acaso seja verificada alguma das hipóteses previstas na Lei, as quais encontram-se taxativamente elencadas no art. 32 da Lei nº 9.307/1996.
Nesse sentido, a declaração de nulidade da sentença arbitral pode ser pleiteada pela parte interessada por duas vias: (i) o ajuizamento de Ação Declaratória de Nulidade de Sentença Arbitral (art. 33, § 1º, da Lei nº 9.307/1996); ou, (ii) a Impugnação ao Cumprimento de Sentença (art. 33, § 3º, da Lei nº 9.307/1996), na hipótese de haver sido apresentado pela parte interessada o competente cumprimento de sentença da decisão que se busca declarar a nulidade.
Independente de qual seja o meio utilizado pela parte interessada para buscar a nulidade da sentença, é certo que ela deverá sempre atentar ao prazo prescricional imposto legalmente.
A Lei de Arbitragem prevê que a Ação Declaratória de Nulidade de Sentença Arbitral deverá ser ajuizada no prazo de até 90 (noventa) dias após o recebimento da notificação da respectiva sentença, seja ela parcial ou final, ou da decisão do pedido de esclarecimentos eventualmente formulado (art. 33, § 1º, da Lei nº 9.307/1996).
Desse modo, não há dúvidas de que a referida demanda somente pode ser ajuizada dentro do prazo decadencial de 90 (noventa) dias.
Por outro lado, no que concerne à possibilidade de formulação de pedido de declaração de nulidade da sentença arbitral em sede de impugnação ao cumprimento de sentença, o Superior Tribunal de Justiça – STJ foi instado a dirimir a controvérsia acerca da aplicação, ou não, do prazo nonagesimal quando da utilização da impugnação com o propósito de buscar a declaração da nulidade da sentença arbitral com fundamento em uma ou mais hipóteses previstas no art. 32 da Lei de Arbitragem.
Nesse sentido, em 12/04/2021, o Superior Tribunal de Justiça publicou o Informativo nº 0691, no qual constou o julgamento do REsp nº 1.900.136/SP (2020/0034599-1) de relatoria da Ministra Nancy Andrighi e que foi julgado pela Terceira Turma, por unanimidade, no qual restou consignado que:
“[…] embora a nulidade possa ser suscitada em sede de impugnação ao cumprimento de sentença arbitral, se a execução for ajuizada após o decurso do prazo decadencial da ação de nulidade, a defesa da parte executada fica limitada às matérias especificadas pelo art. 525, § 1º, do CPC, sendo vedada a invocação de nulidade da sentença com base nas matérias definidas no art. 32 da Lei 9.307/96. […]”
Na ocasião foi firmada a tese de que “A impugnação ao cumprimento de sentença arbitral, devido à ocorrência dos vícios elencados no art. 32 da Lei nº 9.307/1996, possui prazo decadencial de 90 (noventa) dias”.
Inobstante isso, essa mesma questão permanece sendo levada à análise da Corte Superior, tanto que, em 20/09/2021, quando publicado o Informativo nº 0709, que teve, dentre as teses selecionadas, aquela extraída do julgamento do REsp nº 1.862.147/MG (2020/0036910-5) de relatoria do Ministro Marco Aurélio Bellizze, cujo acórdão foi proferido também pela Terceira Turma, por unanimidade, tendo sido estabelecido que não é cabível a apresentação de impugnação ao cumprimento de sentença arbitral, “com base nas nulidades previstas no art. 32 da Lei n. 9.307/1996, após o prazo decadencial nonagesimal”.
Na oportunidade, além de registrar a impossibilidade de arguição das matérias elencadas no art. 32 da Lei de Arbitragem após o prazo de 90 (noventa) dias, o Ministro Relator trouxe a debate, ainda, a incompatibilidade inerente ao desejo da parte interessada de buscar a nulidade da sentença arbitral após decorrido o prazo decadencial, considerando a celeridade, efetividade e segurança jurídica perseguidas pelas partes signatárias de um compromisso arbitral. Veja-se:
“[…]2. Sob o signo da celeridade, da efetividade e da segurança jurídica especialmente perseguidas pelas partes signatárias de um compromisso arbitral, a pretensão de anular a sentença arbitral deve ser intentada de imediato, sob pena de a questão decidida tornar-se imutável, porquanto não mais passível de anulação pelo Poder Judiciário, a obstar, inclusive, que o Juízo arbitral profira nova decisão sobre a matéria.
2.1 A Lei de Arbitragem, atenta a essa premência, estabelece, para tal desiderato, o manejo de ação anulatória (art. 33, caput) e, em havendo o ajuizamento de execução de sentença arbitral (art. 33, § 3º), de impugnação ao seu cumprimento, desde que observado, em ambos os casos, o prazo decadencial nonagesimal. Sem respaldo legal, e absolutamente em descompasso com a inerente celeridade do procedimento arbitral, supor que a parte sucumbente, única interessada em infirmar a validade da sentença arbitral, possa, apesar de não promover a ação anulatória no prazo de 90 (noventa) dias, manejar a mesma pretensão anulatória, agora em impugnação à execução ajuizada em momento posterior a esse lapso, sobretudo porque, a essa altura, o direito potestativo (de anular) já terá se esvaído pela decadência. Precedente específico desta Terceira Turma. […]”
E se é assim, resta evidente que, apesar de ser possibilitado à parte interessada requerer a declaração de nulidade da sentença arbitral tanto por meio de ação própria quanto através de impugnação ao cumprimento de sentença arbitral, é certo que o prazo decadencial de 90 (noventa) dias deverá ser por ela respeitado.
Dessa forma, acaso o cumprimento de sentença arbitral venha a ser ajuizado somente após o decurso do aludido prazo, não mais poderá a parte interessada fundar sua impugnação na nulidade da sentença arbitral, devendo limitar-se, portanto, às matérias inscritas no art. 525, § 1º, do Código de Processo Civil.
Assim, decorrido o prazo decadencial, a parte interessada somente poderá arguir, em sede de impugnação ao cumprimento de sentença arbitral, aquelas matérias relativas à (i) falta ou nulidade de citação se o processo correu à revelia na fase de conhecimento; (ii) ilegitimidade da parte; (iii) inexiquibilidade do título ou inexigibilidade da obrigação; (iv) penhora incorreta ou avaliação errônea; (v) excesso de execução ou cumulação indevida de execuções; (vi) incompetência absoluta ou relativa do juízo da execução; e (vii) qualquer causa modificativa ou extintiva da obrigação, desde que supervenientes à sentença arbitral.
É evidente, portanto, a importância de a nulidade da sentença arbitral ser de logo requerida pela parte interessada sempre que for verificada a incidência de alguma das hipóteses de nulidade listadas no art. 32 da Lei nº 9.307/1996, fazendo prevalecer, inclusive, a celeridade do procedimento, que é inerente à arbitragem.
Agindo dessa forma, a parte interessada não dependerá do ajuizamento do cumprimento de sentença arbitral para, somente então, apresentar sua impugnação, o que minimizará, de certo, os riscos de eventual perda do direito de ver reconhecida a nulidade da sentença proferida pelo juízo arbitral.
Sendo assim, considerando que o prazo para requerimento da nulidade da sentença arbitral é de 90 (noventa) dias, não há dúvidas de que é aconselhável à parte interessada sua antecipação à instauração de eventual cumprimento de sentença arbitral, apresentando, desde logo, as razões para a declaração da nulidade da sentença arbitral por meio de ação própria.
Por: Marivalda Costa