Apesar de ser um assunto há muito debatido, a vinculação dos árbitros e das sentenças arbitrais aos precedentes judiciais ainda é um assunto que polariza as opiniões dos doutrinadores, uma vez que alguns deles entendem que o árbitro, assim como o magistrado, deve observar e buscar aplicar os precedentes firmados aos casos que estiverem sob sua análise, enquanto outros doutrinadores entendem, em linhas gerais, que, as partes são livres para estabelecer na Convenção de Arbitragem se os precedentes devem ser observados, seja para sua aplicação ou para seu afastamento, ou se não deverão ser observados.
Para muitos daqueles que defendem a vinculação dos árbitros e, consequentemente, das sentenças arbitrais aos precedentes judiciais, tal posicionamento seria justificado pelo fato de os precedentes serem considerados uma fonte do direito.
Inobstante todo o debate pragmático existente por trás desse posicionamento, faz-se importante trazer à análise quais razões podem motivar as partes a optar pelo procedimento arbitral, a despeito da possibilidade de ingressarem judicialmente, com vistas à solução da controvérsia instaurada.
Em regra, a escolha da Arbitragem como método de resolução do conflito decorre do fato de que nela as partes serão livres para o ajuste de diversas questões relativas ao procedimento, inclusive a escolha do(s) árbitro(s).
Nesse sentido, poderão as partes, por exemplo, escolher um árbitro especialista na matéria sob análise, o que facilitará sua compreensão sobre o caso e poderá garantir uma sentença mais justa, afinal, ele será escolhido de comum acordo entre elas levando em consideração seu nível técnico e especialidade.
Além disso, importa destacar que o árbitro, por não possuir diversos processos para julgar, poderá dedicar muito mais tempo para a análise dos argumentos levantados por cada uma das partes e para, efetivamente, estudar qual a melhor solução para o caso na espécie.
É justamente essa especialização do julgador, associada à maior disposição de tempo e à possibilidade de ajuste de todo o procedimento que traz, ainda, um elemento extra à escolha da arbitragem, em detrimento do Poder Judiciário, qual seja a celeridade processual.
Dentre as características de maior destaque para a escolha da Arbitragem há, ainda, a possibilidade de definição da norma de direito material aplicável à espécie, de modo que “as partes podem escolher qual a regra a ser aplicável, podendo ainda convencionar que o julgamento se realize com base nos princípios gerais do direito, nos usos e costumes e nas regras internacionais de comércio”.
Ora, sendo certo que essas são algumas das razões para a escolha da arbitragem como método de resolução do conflito, não haveria razão, então, para vinculação dos árbitros e das sentenças arbitrais aos precedentes judiciais, sob pena de esvaziamento de todos os critérios estabelecidos pelas partes no momento da escolha da Arbitragem, já que no Poder Judiciário diversos desses critérios não podem ser estabelecidos pelas partes, como é o caso da escolha do direito material aplicável à espécie.
Note-se que aqui não se está defendendo que os precedentes sejam completamente ignorados pelos árbitros, mas sim que não faria sentido o árbitro ficar vinculado a um precedente e obrigado a reproduzi-lo – apesar de existir entendimento em sentido contrário na doutrina –, inclusive porque, se assim o fosse, não haveria razão para as partes escolherem a arbitragem quando há o estado-juiz à sua disposição para a solução do conflito.
Em contrapartida, como na Arbitragem as partes são livres para contratarem da forma que melhor lhes convier, não haverá óbices ao estabelecimento, na Convenção de Arbitragem, de vinculação do árbitro e da sentença arbitral aos precedentes.
De igual modo, as partes podem, também, estabelecer que desejam que o árbitro decida livremente, podendo observar os precedentes, apesar de não estar a eles vinculado, ou podendo até mesmo determinar que não desejam que eles sejam levados em consideração, estabelecendo que não poderão ser invocados como fundamento para a solução da controvérsia.
No entanto, não se pode negar que a observância dos árbitros aos precedentes – e não sua vinculação –, gera uma certa segurança jurídica especialmente para as partes, apesar de tal fato não poder constituir limitador ao livre convencimento do árbitro, ou mesmo uma obrigação, especialmente quando as partes expressamente delimitarem as fontes do direito a serem utilizadas em cada caso.
Todavia, aqui voltamos a destacar um ponto abordado inicialmente, qual seja o da não obrigatoriedade de vinculação do árbitro aos precedentes, afinal, se as partes desejassem a pura replicação dos precedentes, sem quaisquer ponderações a serem feitas pelo árbitro, bem como uma análise técnica mais acurada, dificilmente recorreriam ao procedimento arbitral, mas tão somente ao Poder Judiciário, afinal, conforme é cediço, o procedimento arbitral possui um custo bem mais elevado que o procedimento judicial, de modo que sua escolha não seria economicamente viável para as partes.
Sem a pretensão de esgotar um tema tão interessante e complexo como esse, importa destacar que, diante da divergência doutrinária existente quanto à vinculação, ou não, dos árbitros aos precedentes judiciais, demonstra-se importante que as partes sempre estabeleçam na Convenção de Arbitragem qual deverá ser a influência dos precedentes para fins de resolução do conflito existente, evitando-se, desse modo, insatisfações quanto ao procedimento a ser adotado, bem como uma maior segurança jurídica.
Por: Marivalda Costa